Trajetória

Santa Isabel, uma história para não ser esquecida

Historiador Cledenir Mendonça traz à tona a história curiosa do distrito que um dia foi cidade

Foto: Divulgação - Santa Isabel, a 60 quilômetros de Arroio Grande, teve seu apogeu econômico e político no final do século 19, a partir das charqueadas instaladas no local


Um fato político curioso ocorrido na Zona Sul do Estado e pouco comentado na atualidade é tema do livro Santa Isabel dos Canudos - No eco do passado, a memória pede socorro (Editora Buqui), que o historiador e pesquisador rio-grandino Cledenir Vergara Mendonça lança na próxima segunda-feira (8). A obra faz um relato histórico da trajetória do segundo Distrito de Arroio Grande, que por 11 anos, no século 19, foi uma independente e próspera vila.

O hoje distrito é presente na história do Rio Grande do Sul desde o início do século 19. Localizado a 60 quilômetros de Arroio Grande e às margens do canal São Gonçalo, o povoado que se tornou freguesia em 1790 e depois foi elevado a vila/município tinha a economia alicerçada na indústria do charque.

A vila teve pujança, uma memória corroborada pelo que restou do casario daquela época. Um dos acontecimentos históricos, que confirmam o prestígio, foi a visita do imperador Dom Pedro II, em 1865, acompanhado pela filha dele, Isabel e pelo genro, o conde D’eu.

O interesse por Santa Isabel nasceu na década de 80, quando Mendonça trabalhava neste distrito como técnico agrícola, no setor do arroz. Posteriormente, fez a graduação em História e passou a pesquisar sobre o antigo município, um trabalho que ele apresenta neste seu terceiro livro. “Santa Isabel para mim é a cidade esquecida. Eu passava por lá e via que tinha uma coisa estranha. Aqueles prédios antigos, aqueles vestígios quase arqueológicos, um patrimônio dilapidado”, conta.

Mas foi a curiosidade sobre um tal “campo do povo”, que ele ouviu falar nos anos 90, uma espécie de condomínio para uso coletivo da comunidade, que o levou a começar pesquisas aprofundadas sobre o local. No Instituto Histórico e Geográfico de Porto Alegre, descobriu documentação que o ajudou a remontar o processo de emancipação do distrito, ocorrido em 1883. “Estavam lá as questões do charque, do escravismo. Tu estudas sobre a indústria do charque a partir das charqueadas de Pelotas, mas aqui, em todo esse trecho do São Gonçalo, tinham charqueadas”, comenta.

Desde o início do povoado
No livro o pesquisador apresenta aos leitores como se deu a formação do povoado, até se tornar uma vila, desmembrada de Arroio Grande em 1882. Até janeiro de 1893, quando Santa Isabel voltou a ser distrito de Arroio Grande, num dos primeiros atos do presidente do Estado do Rio Grande do Sul, Júlio de Castilhos. Não adiantaram as manifestações, brigas e até atos de violência ocorridos na época.

De acordo com o relato do autor, “o livro propõe quatro eixos básicos - Freguesia e seus antecedentes, Escravidão, Vilamento e Desvilamento, com suas causas e consequências”. “Eu faço uma síntese histórica da Revolução Farroupilha, por exemplo, porque o povoado já existia naquele momento”. O pesquisador também faz uma análise sobre a população escrava, como se davam as compras, vendas, permutas e empréstimos.

Santa Isabel se tornou freguesia em 1866. Quando se deu a municipalização, a resistência de Arroio Grande, que se negou a entregar o município, mas teve de fazê-lo. Na sequência, o autor aborda o processo de “desvilamento” e suas motivações. “Dia 9 vai fazer 141 anos da primeira eleição para a Câmara de Vereadores de Santa Isabel dos Canudos”, lembra o pesquisador.

O historiador relata que o fato se torna ainda mais curioso, porque até agora somente três municípios foram suprimidos no RS: Santa Isabel, Santa Cristina, na região de Taquara, e Santo Amaro, que passou a Triunfo. Segundo Cledeir Mendonça, foi a pujança trazida pelas charqueadas que motivou o desmembramento. “Os caminhos antigos eram as águas. O São Gonçalo era a nossa BR. Toda essa relação de comércio se dava pelo canal, ali era um ponto estratégico de entrada e saída das localidades. Sob o seu porto (de Santa Isabel) acontece todo o processo de desenvolvimento da região.”
Segundo o autor, foi o declínio do processo industrial do charque uma das causas do retorno ao status de distrito. A pressão de Arroio Grande, o empobrecimento da vila e a perda de força política também contribuíram.

Tanto a criação da vila quanto o retorno dela a Arroio Grande criaram momentos de conflito e resistência de ambos os lados. Na verdade, Arroio Grande nunca aceitou a perda de 40% da arrecadação municipal e 50% da área. Na retomada do município, Santa Isabel dos Canudos tentou reagir e então ocorreram atos de violência.

Para o autor, essa reanexação provocou um dos maiores êxodos do Rio Grande do Sul, esvaziando a localidade. “Hoje as referências, memórias e resistência do povo isabelense estão nas mãos dos pescadores, porque aqueles que moldaram a vila no século 19 saíram de lá. Os grandes produtores de soja, de arroz, nem são de lá e pouco se importam com o local”, afirma.

Sessão solene e autógrafos
O lançamento de Santa Isabel dos Canudos - No eco do passado, a memória pede socorro ocorrerá na segunda-feira, em Arroio Grande. Às 9h, Cledenir Mendonça participa de sessão solene e faz palestra na Câmara de Vereadores; às 18h30min o autor faz a sessão de autógrafos na Biblioteca Pública Zélia Lisboa Sobral Soares. Na terça-feira, às 14h, o lançamento será na comunidade, na igreja de Santa Isabel.
Além de Arroio Grande, a obra estará à venda nas livrarias Hippocampus e Usina das Artes, no balneário Cassino, em Rio Grande.

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